Portugal

Feira da Ladra: “Não há negócio, isto agora é uma brincadeira”, afirma feirante

Feirantes falam de uma mudança na tradição da Feira da Ladra. Quem percorre o Largo Dr. Bernardino António Gomes (Pai) e sobe o Campo de Santa Clara ainda observa potenciais clientes das mais variadas gerações. No entanto, os protagonistas parecem mesmo ser os turistas, o que transformou a realidade do icónico espaço lisboeta.

Campo da Santa Clara, espaço onde todas as terças-feiras e sábados se realiza a tradicional Feira da Ladra.

Maria e Paulo são dois feirantes esporádicos que procuram vender os seus artigos lado a lado. Ela negoceia “velharias”, ele CDs e DVDs. Durante toda a manhã Paulo lucrou apenas 5 euros, o que contribui para a sua perspetiva de que, por vezes, ser feirante não compensa. “É mais o cansaço e o trabalho que o ganho. Mas temos de tentar”, diz Maria.

Para além do crescimento de negócios online, o fraco comércio ‘cara a cara’ resulta, dizem, de uma perda de identidade, não só da Feira, como de Lisboa. Maria refere que os turistas “compram, mas ainda querem mais barato que os portugueses”. “Não há negócio, não há pessoas, isto agora não é feira, é uma brincadeira”, indica Paulo.

Mais acima, em direção ao Mercado de Santa Clara, Sandra é uma das feirantes regulares, estando no mesmo espaço há 11 anos. Devido ao crescimento de turistas na feira, muitos feirantes adaptaram-se tendo em conta o tipo de produto que vendem. De artigos mais tradicionais passaram para as bijuterias ou roupa. Ela manteve-se nas “antiguidades”, particularmente os azulejos, louça ou itens de colecionismo como postais, por exemplo.

“Os turistas é que neste momento são o nosso melhor cliente”. Os portugueses que a procuram são, normalmente, os que já a conhecem. Ainda assim, Sandra concorda que a feira já não é como era. “Há 15 anos não era assim, só que com o turismo alterou”.

Para além desta transformação identitária da Feira da Ladra, o passado dia 2 de março apresentou outra agravante na capacidade de realizar negócio: a chuva e o vento. Maria e Paulo têm os seus espaços sem qualquer proteção contra as condições atmosféricas adversas. Para muitos como eles a Feira da Ladra terminou mais cedo. Apesar de sábado ser tradicionalmente o dia mais movimentado, por volta das 14 horas eram muitos os feirantes que ou já tinham ido embora, ou se preparavam para o fazer. Maria planeava ficar “até à próxima chuvada”.

Já Sandra possui uma banca mais composta, desistindo apenas se “estiver a chover torrencialmente”. Dias destes “às vezes são os melhores”. Aponta para um espaço que costuma estar cheio de feirantes, referindo que muitos foram embora às 11 horas ou ao meio-dia, dando mais possibilidade de negócio para os restantes. “Quem cá fica sempre vai vendendo. Mas mete medo, pode-se partir uma tenda, e a minha custa 1000 euros”.

É este atual contraste que vai caracterizando a Feira da Ladra. Entre os feirantes que se encontram ali por necessidade, participando, inclusive, em diversas outras feiras, e uma clientela maioritariamente estrangeira e jovem, que olha para aquele espaço de artigos vintage ainda de uma forma romântica, em que as bijuterias, roupas, ou acessórios são os produtos mais procurados.

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